Rara Avis in Terris, JUVENAL, Sátiras, VI, 165

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Depois de Torga, o prémio Camões para Gullar


«O poeta e dramaturgo brasileiro Ferreira Gullar é, desde ontem, o mais recente Prémio Camões. O anúncio foi feito pela ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, na presença dos membros do júri, e volta a galardoar a poesia como já acontecera em 1989 com Miguel Torga, o primeiro distinguido.

O autor brasileiro desconhecia a escolha do seu nome à hora de fecho desta edição, mas a sua obra não é totalmente ignorada em Portugal, onde a recém-falida editora Quási publicou a Obra Poética Completa de Ferreira Gullar, além de um livro infantil.

Nascido José Ribamar Ferreira, a 10 de Setembro de 1930, na capital do Estado brasileiro do Maranhão, o quarto de onze filhos tem uma carreira literária e de intervenção social e política que destoa devido à sua intensidade da maioria dos já premiados.

Ainda há meses, Ferreira Gullar voltara a usar o seu site para inscrever críticas ao Governo devido à alteração dos internamentos psiquiátricos. Escrevia: "Depois de algum tempo calado, volto a resmungar. Este primeiro resmungo vem a propósito de um problema muito grave que denunciei não faz muito tempo (...)." No mesmo local já colocara outras notas de contestação, mas também sobre a sua arte, a criação literária. Ferreira Gullar foi sempre radical na sua obra e posicionamento político, situação que o levou a ter um importante papel nos movimentos concreto e neo-concreto. Em 1961, no entanto, abandonou esta vanguarda artística para se entregar na arte militante do Centro Popular de Cultura, uma organização da poderosa União Nacional de estudantes que liderou muitas das lutas estudantis sob o regime militar. A primeira encomenda que lhe é feita por Oduvaldo Vianna Filho trata a reforma agrária, é escrita ao estilo da literatura de cordel (género típico nordestino) e intitula-se João Boa Morte, Cabra Marcado para Morrer.

Mesmo com as restrições impostas pelo golpe militar, em 1964, Gullar manter-se-á bastante activo e, a quatro mãos, publicará em 1966 a premiada peça Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come; em 67, a peça "A saída? Onde está a saída? e em 68, Dr. Getúlio, sua vida e sua glória". Com o Acto Institucional n.º 5, é preso e em 1970 entrará na clandestinidade.

O exílio será o passo seguinte, partindo para Moscovo, Santiago do Chile, Lima e Buenos Aires até ser absolvido e poder regressar. Em 2009, foi considerado uma das cem mais influentes personalidades do Brasil. Ou seja, um "resmungão" social e intelectualmente activo.

O júri do Prémio Camões é presidido por Helena Buescu e composto por Seabra Pereira, Inocência Mata, Luís Carlos Patraquim, António Carlos Secchin e a escritora Edla van Steen. Ferreira Gullar sucede ao escritor cabo-verdiano Arménio Vieira, em 2009, ao brasileiro João Ubaldo Ribeiro, 2008, e António Lobo Antunes, em 2007. O prémio foi criado pelos governos de Portugal e do Brasil em 1989 e é considerado o de maior prestígio da língua portuguesa.»,

Diário de Notícias


1 comentário:

Fernando Campanella disse...

Fico feliz pelo Gullar, poeta de tantas nuances e perspectivas, vai do puramente lírico ao social, da tradição à vanguarda, e faz tudo isso muito bem. Um grande poeta.Fiz uma postagem sobre ele no blog há uns nove meses atrás e te envio por aqui:

http://fernandocampanella.blogspot.com/2009/03/ostra-e-poesia.html

Bjinhos.